Planejamento - Advocacia, Pintura & Xadrez

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Planejamento

ADVOCACIA



O propósito deste trabalho não é apenas fornecer "dicas" úteis ao advogado sobre o uso de tecnologia em seu escritório. É, como afirmado, fornecer modesta contribuição para a modernização da advocacia brasileira e, conseqüentemente, algum subsídio à modernização da justiça, eis que a advocacia é um de seus órgãos integrantes.

Assim, não poderíamos deixar de repetir que a modernização não se faz apenas com a racionalização dos meios e processos, com a eficiência (economia de meios). Indispensável é a compatibilização da demanda ambiental com os meios organizacionais, a racionalidade dos objetivos e valores que orientam ou devem orientar a profissão.

Daí entendermos que os nobres valores que orientam o exercício de nossa profissão, o Direito e a Justiça, devem sempre estar presentes, não só nesse exercício diário, mas também na fixação dos objetivos e metas do escritório ou da empresa advocatícia.

A racionalidade do planejamento do advogado deverá, pensamos, ter isto presente, pena do fracasso de qualquer empreendimento.

É, portanto, com esta dupla finalidade que tecemos considerações sobre planejamento: em primeiro lugar, o fornecimento, ao advogado, de subsídios ao planejamento adequado de seus objetivos e acompanhamento do desempenho de seu escritório (e, aí, temos o programa gerenciador de banco de dados e o programa de "planilha eletrônica" como poderosos instrumentos); em segundo lugar, subsídios à racionalidade de tal planejamento, frente aos valores que informam o exercício da profissão.

A advocacia não se exerce de forma autônoma do meio cultural e dos ditames da ocasião.

Antigamente o trabalho se fazia frente a mudanças mais lentas e previsíveis. Hoje, porém, as modificações no meio externo ocorrem com grande velocidade e a profissão vai ficando mais complexa, não só pelos desafios maiores provocados pela intensidade e rapidez das alterações havidas no meio ambiente, mas também pelos novos papéis e funções que os advogados devem desempenhar na sociedade.

Assim, ao invés de previsões e projeções incrementalistas do passado, hoje o homem está obrigado à prospecção e ao planejamento estratégico.


Planejamento Estratégico


"O planejamento estratégico tem a finalidade de garantir um sentido adequado na direção futura, uma vez que sua elaboração pressupõe o máximo de conhecimento possível de fatores externos não controláveis e de fatores internos controláveis, ou seja, a compatibilidade de recursos, valores e oportunidades existentes na ambiência externa com os recursos e potenciais internos. Consiste na habilidade gerencial de converter os recursos e valores externos em planos empresariais para a ação futura. Difere do planejamento empresarial tradicional, por ser um processo contínuo e sistemático de planejamento, controle e avaliação.

A avaliação prospectiva consiste em um processo de se ‘olhar’ o futuro, estabelecendo alternativas para a empresa, de forma a possibilitar a avaliação contínua dos cursos de ação e sua rápida e adequada alteração conforme novos obstáculos e oportunidades. Hoje existem dezenas de técnicas utilizadas para a análise prospectiva do futuro. Essas técnicas, normalmente, procuram criar cenários futuros, tanto da empresa, como da ambiência, para definir objetivos mais adequados e os ajustes necessários à implementação. São técnicas que possuem limitações, pois são inteiramente baseadas no subjetivismo, já que análise de dados objetivos é impossível".

No texto acima, e na disciplina que lecionava na Escola Brasileira de Administração Pública (EBAP), da Fundação Getúlio Vargas, o Professor Paulo Roberto Mota (
Planejamento Organizacional Integrado – FGV-EBAP-CIPAD, p. 22/23) delineia um perfil do executivo que pode perfeitamente adaptar-se àquele do advogado. Mudando as palavras, poderíamos dizer que o exercício da advocacia exige mais do que bom senso, imaginação e experiência. Mais importante serão as qualidades de iniciativa, coragem, persistência e integridade. O advogado assemelha-se ao dirigente moderno, que

"é essencialmente um individuo capaz de investir tempo e energia no futuro de sua empresa. Assim, deve voltar-se para recursos, valores e oportunidades externas, orientar-se para os objetivos de sua empresa, exigir de si mesmo um alto padrão de desempenho, assumir riscos, enfrentar o ônus psicológico de decisão e de liderança, tolerar as ambigüidades e descontinuidades da ambiência externa, planejar, organizar e supervisionar o trabalho interno, segundo os objetivos prefixados, assumir a responsabilidade sobre os resultados de seu trabalho, identificar desafios e meios de superá-los, orientar-se para a inovação e mudança e, principalmente, investir na capacidade de sua equipe de trabalho" (
PAULO ROBERTO MOTA, Planejamento Organizacional Integrado – FGV-EBAP-CIPAD, p. 41/42).

Não se pode esquecer que "o escritório do advogado não é casa de comércio que cresça e prospere em razão da publicidade que faça" (Maurice Garçon) e que "a advocacia não é somente uma profissão, mas uma instituição que se liga por vínculos invisíveis a toda a organização política e social" (Zanardelli).

"Advogado afeito a não ver na minha banca balcão de mercenário, considero-me obrigado a honrar a minha profissão como órgão subsidiário da justiça, como um instrumento espontâneo das grandes reivindicações do direito, quando os atentados contra ele ferirem diretamente, através dos indivíduos, os interesses gerais da coletividade" (Ruy Barbosa).

"Não fazer da banca balcão, ou da ciência mercatura" (Ruy Barbosa).

Mas é a bem da própria justiça que o advogado deve TAMBÉM atuar como empresário, planejando e racionalizando seu trabalho na busca de melhores resultados, resultados mais EFETIVOS (socialmente relevantes).

Paulo Roberto Mota, na obra citada, denominou de "planejamento organizacional integrado" aquilo que poderíamos chamar de somatório de técnicas de planejamento estratégico com aquelas próprias da administração ou gerência por objetivos (APO ou GPO). Como essencialmente componentes do planejamento estratégico, poder-se-iam entender as seguintes etapas preliminares
(extraídas do "Roteiro Para Planejamento Organizacional", obra citada de P. R. Mota, p. 47/48):  

ANÁLISE DA MISSÃO SÓCIO-ECONÔNICA DO ESCRITÓRIO, que inclui a análise do presente (o que é o escritório?), a análise do futuro (o que será?) e a análise de relevância (o que deveria ser?);

DIAGNÓSTICO DA AMBIÊNCIA EXTERNA, com identificação de valores sociais desejáveis (por exemplo, a democratização da justiça), recursos externos, oportunidades, ameaças; inclui-se aqui a análise prospectiva (de tendências nos campos social, político, econômico e tecnológico);

DIAGNÓSTICO DA AMBIÊNCIA INTERNA, com avaliação dos recursos existentes, identificação de valores internos (próprios da profissão ou da empresa advocatícia), pontos fortes e fracos; insere-se aqui uma avaliação dos resultados atuais;

CONTRAPOSIÇÃO DA AVALIAÇÃO PROSPECTIVA COM OS RESULTADOS ATUAIS, verificando-se o grau de satisfação externa, avaliação de custos e benefícios de alternativas, avaliação de risco e tempo, verificação de viabilidade;

OPÇÕES ESTRATÉGICAS FUNDAMENTAIS, pela escolha de alternativas, objetivos e políticas básicas, definição de prioridades (levando em conta a maximização das oportunidades, satisfação das necessidades, utilização ótima dos recursos, viabilidade externa e institucional, inovação sistemática);

DEFINIÇÃO DO PLANO A LONGO PRAZO (especificação dos objetivos estratégicos e táticos, definição da forma de distribuição e concentração de recursos).

A partir daí, o citado "roteiro"se volta para aspectos mais próprios da Administração por Objetivos, assunto do próximo título.


Administração por objetivos


Após o exame de uma variada gama de conceitos, Geraldo R. Caravantes
(Administração por Objetivos – Uma Abordagem Sócio-Técnica, Ed. McGraw-Hill do Brasil Ltda., 1977, p. 91 e seguintes)  conceitua ApO como um método de planejamento e avaliação, baseado em fatores quantitativos, pelo qual superior e subordinados elegem áreas prioritárias, estabelecem resultados a serem alcançados (objetivos), dimensionam as respectivas contribuições e procedem ao sistemático acompanhamento do desempenho.

A formulação de objetivos é o ponto focal desta e de outras técnicas de planejamento a longo prazo. Objetivos ou resultados a serem alcançados, condições futuras desejáveis, essas condições "dizem respeito a uma hierarquia de objetivos que inclui missões, propósitos, objetivos, metas, cotas e prazos. À medida em que se desce a tal hierarquia, os objetivos tornam-se mais precisos, quantificáveis e mensuráveis"
(BIANOR SCELZA CAVALCANTI, Gerência por Objetivos, FGV-EBAP-CIPAD, p. 24).

Receber uma média mensal de honorários no montante de tanto, até uma data tal – é um objetivo. Ultimar uma execução judicial no prazo máximo de 6 meses – é outro objetivo. Fazer a declaração para o imposto de renda até 31 de março – é também um objetivo.

Os objetivos devem ser mensuráveis, verificáveis em sua realização, devem estar diretamente relacionados com o papel ou a missão do advogado, devem ser realistas e viáveis e, ao mesmo tempo, representar um significativo desafio para o profissional. Ao ser alcançado, deverá o resultado justificar o tempo e os recursos despendidos na sua obtenção.

Os objetivos devem ser explicitados segundo áreas de preocupação (áreas-chave de resultados) previamente definidas (por exemplo, as áreas tradicionais de SATISFAÇÃO DA CLIENTELA, INOVAÇÃO, POSIÇÃO NO MERCADO, PRODUTIVIDADE, RECURSOS FINANCEIROS/MATERIAIS, EFICIÊNCIA E DESENVOLVIMENTO DO PESSOAL, RESPONSABILIDADE PÚBLICA).

Muitos esquemas e roteiros têm sido apresentados para a formulação adequada de objetivos. PAUL MALI
("Princípios de Gerência por Objetivos", Ed. Pallas S/A, Rio, 1976) recomenda para a GpO (ou ApO) um processo de cinco fases: descoberta, fixação, validação, execução e controle do objetivo. CARAVANTES (op. cit.), apresenta uma aplicação do MAO (Método de Aperfeiçoamento Organizacional), composto de 4 fases ou etapas: fixação dos objetivos organizacionais e dos padrões de desempenho; identificação e análise de problemas de desempenho e de forças propulsoras/restritivas; estratégias e programas de ação para o aprimoramento do desempenho; implementação da ação.  P. R. MOTA, no "roteiro" mencionado, prevê: (1) definição dos objetivos organizacionais específicos, incluindo subobjetivos por áreas, setores ou atividades principais; (2) estruturação da organização segundo objetivos gerais e setoriais (projetos, sistemas ou departamentalização; (3) definição de responsabilidades por metas e resultados específicos; (4) definição dos planos de ação; e (5) análise e revisão periódica.

Na prática, contudo, temos preferido a seguinte ordem de procedimento:

ETAPAS ACIMA PREVISTAS PARA O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO;

DEFINIÇÃO DAS ÁREAS-CHAVE DE RESULTADOS;

EXPLICITAÇÃO DE INDICADORES DE DESEMPENHO PARA CADA ÁREA DE RESULTADO (indicadores de desempenho são fatores ou unidades de medida que o advogado levará em conta para julgar como determinada responsabilidade se realiza a contento; por exemplo, número de clientes; número de casos; número de ações; valor anual ou mensal de honorários recebidos; tempo médio de solução dos casos (judiciais e extrajudiciais); custo do escritório; etc. Os indicadores poderão referir-se a quantidade (quanto?), qualidade (quão bom?), tempo (quando?) e custo (que despesa?). Servirão para o estabelecimento dos objetivos, para o controle e informe da situação);

EXPLICITAÇÃO DOS OBJETIVOS E METAS (os objetivos, de longo prazo, serão os indicadores em sua situação ideal, padrão de desempenho a ser atingido, digamos, em 2 ou 5 anos; metas serão os indicadores em situações intermediárias, em valores a serem atingidos em prazo mais curto, digamos, em 6 meses ou em 1 ano);

IDENTIFICAÇÃO DA ESTRATÉGIA DE AÇÃO PARA A OBTENÇÀO DOS RESULTADOS;

IMPLANTAÇÃO, CONTROLE E REAJUSTAMENTO PERIÓDICO.

Por exemplo, num escritório de advocacia, o lucro (receitas menos despesas) médio obtido nos últimos 6 meses poderá ser um dos indicadores de desempenho para a área-chave de resultados financeiros. Frente aos diagnósticos da avaliação prospectiva com o resultado atual, entende-se como situação IDEAL um lucro médio mensal de R$ X, a ser atingido em 2 anos (objetivo desafiante e atingível), prevendo-se, como meta, para daqui a 6 meses, o valor de R$ Y, etc. A estratégia de ação dependerá desses valores e, principalmente, das análises realizadas a propósito das oportunidades, pontos fortes e fracos, recursos existentes, tendências, grau de satisfação externa, etc.

O subsistema de informação montado para o acompanhamento dos resultados, avaliação do desempenho e refixação dos objetivos e metas, periodicamente, constitui o que se denominou de planejamento, controle e avaliação do desempenho.

Esse subsistema, parte integrante e fundamental do subsistema de informação gerencial do escritório, pode ser operacionalizado com saídas do programa de banco de dados e saídas do programa de formulário eletrônico, como visto.

Mudança ambiental planejada.


Modernização é "o processo de mudança social pelo qual as sociedades MENOS desenvolvidas procuram adquirir as características comuns às sociedades MAIS desenvolvidas"  
(BEATRIZ WARLICH, "Modernização Administrativa"- FGV/EBAP/CIPAD – Rio, out/nov/77, p. 32, citando a "Internacional Encyclopaedia of Social Sciences").

A modernização ultrapassaria o limite demarcado pela simples reforma administrativa. Enquanto esta (reforma) geralmente se faz nos instrumentos e processos, perseguindo a racionalização das atividades-meio, aquela (modernização) seria teleológica, pressupondo redefinição dos próprios fins, objetivos e metas, além de explicitar os programas e projetos a serem adotados.

A modernização se preocupa com a eficácia (obtenção de resultados) e efetividade (alcance de objetivos socialmente relevantes), enquanto que a reforma está voltada para a eficiência (maior economia dos meios, melhoria do desempenho interno de uma organização).

A reforma, de regra, se faz em sistema fechado; a modernização se realiza, necessariamente, num sistema aberto, via interação com o meio ambiente.

O conceito adota o posicionamento de clara separação entre os países ditos "desenvolvidos" (mais desenvolvidos) e aqueles "em desenvolvimento" (menos desenvolvidos).

Dicotomia que, diga-se, é negada por alguns autores de peso como, por exemplo, Alberto Guerreiro Ramos, que salientava que, "no presente momento da história, a dicotomia entre sociedades desenvolvidas e em desenvolvimento é equivocante. Na realidade, a categoria cardinal das ciências sociais é o Mundo, que hoje possui as características de um sistema. Sob o prisma desse sistema, todas as sociedades estão em desenvolvimento. Todas elas são, em diferentes graus, ao mesmo tempo atrasadas e modernas. Indicadores de modernização ‘só os poderá haver AD HOC, e sua natureza e aplicação somente têm sentido quando postas em relação com as POSSIBILIDADES de desenvolvimento ou modernização de cada sociedade" (
"A Modernização em Nova Perspectiva em Busca do Modelo da Possibilidade", in Beatriz Warlich, op. cit.).

A essas possibilidades, chama ele de teoria P (da possibilidade), que se contrapõe à teoria da necessidade (N), segundo a qual existirá uma lei de necessidade histórica que compele as sociedades menos desenvolvidas a atingir o estágio de modernização das mais evoluídas.

FRED A. RIGGS
("A Ecologia da Administração Pública", "Administração nos Países em Desenvolvimento", in Beatriz Warlich, op. cit., p. 21/59), com sua análise funcional estrutural, delimita três modelos, o "concentrado" (próprio dos países pouco desenvolvidos, em que poucas funções atendem a quase todos os objetivos, v. g., as funções de realeza e família atendendo a objetivos religiosos, educacionais, políticos, econômicos e administrativos), o "difratado" (situado no pólo oposto, conjunto de características presentes nos países mais desenvolvidos, como os Estados Unidos, com um grande número de funções, cada uma específica a determinado objetivo) e o "prismático", situação intermediária própria dos países "em desenvolvimento".

O Brasil seria um país prismático, com as características próprias deste modelo: o FORMALISMO (discrepância entre as normas escritas e a realidade prática), a SUPERPOSIÇÃO (determinação do comportamento administrativo por critérios outros – políticos, econômicos, afetivos, sociais, ao invés de critérios com base no desempenho, mérito, etc.) e a HETEROGENEIDADE (concomitância dos opostos, coexistência ou convivência do "antigo" com o "moderno").

O formalismo estimularia a corrupção, já que "o poder de exigir uma estrita observância da lei confere ao funcionário uma arma que muitas vezes pode usar em proveito próprio, pois, estando também a seu alcance abrir mão dos rigores da lei, fica em condições de tornar as coisas mais fáceis para quem esteja disposto a oferecer-lhe uma compensação" (
Fred A. Riggs, "A Ecologia da Administração Pública", idem, pág. 56).

Assim, é característica do formalismo tolerar de fato o que a lei proíbe e condena, o que de direito se impede ou se pune.

Original a respeito é a posição de Guerreiro Ramos
("Administração e Estratégia do Desenvolvimento", p. 432, in Beatriz Warlich, op. cit., p. 55):

"O formalismo não é característica bizarra, traço de patologia social nas sociedades prismáticas, mas um fato normal e regular, que reflete a estratégia global dessas sociedades no sentido de superar a fase em que se encontram. Em outras palavras: o formalismo nas sociedades prismáticas é uma estratégia de mudança social, imposta pelo caráter dual de sua formação histórica e do modo particular como se articulam com o resto do mundo".

Mas a evolução de uma sociedade prismática para a difratada não se faz apenas pela modernização ou adaptação ao impacto de um sistema mais difratado (segundo Riggs, mudança em virtude de pressões exógenas). Existe outro processo, denominado INOVAÇÃO, pelo qual uma sociedade, motivada por forças endógenas, originariamente descobre ou inventa, incorporando como de sua prática normal, alguma nova estrutura ou padrão de comportamento.

Embora a inovação seja mais típica de países mais desenvolvidos, e a modernização, de países menos desenvolvidos, isto não significa que não ocorra inovação nas sociedades prismáticas. Como exemplo, no Brasil, são sempre apontados, como inovação, o FGTS e a correção monetária.

A inovação chega a atingir papel tão relevante que alguns autores, como Paulo Roberto Mota chegam a sugerir, para a viabilização da modernização, uma estratégia de inovação, concretizada na mudança AMBIENTAL planejada.

Essencial seria que se deixassem de lado as tradicionais concepções de análise e intervenção nas organizações, concebidas ora como uma estrutura de funções especializadas, ora como uma estrutura de autoridade, ou de relações interpessoais e intergrupais, às vezes como uma estrutura para a tomada de decisões.

Essas concepções criam padrões de inferência em relação à mudança, quase sempre unilaterais e voltados apenas para um dos aspectos concebidos.

A mudança ambiental planejada dirige-se mais para o impacto na ambiência social (ao invés de apenas na tradição e sobrevivência da organização), com a racionalidade dos produtos (ao invés da racionalidade interna), com a flexibilidade da estrutura funcional (ao invés da burocratização e uniformização estrutural funcional), preocupada com as necessidades sociais e dos clientes (ao invés de necessidades pessoais e organizacionais); estaria comprometida com objetivos e valores (ao invés da neutralidade).

P. R. Mota (op. cit.) conclui afirmando que o problema não é unicamente a mudança dos padrões de racionalidade administrativa envolvendo reformas de estruturas, processos ou comportamento gerencial. "Trata-se essencialmente de estabelecer condições organizacionais mais adequadas ao atendimento das demandas ambientais sobre a organização e elaborar melhor o produto final da organização. As dimensões, racionalidade interna e propósito social da organização devem ser tratados conjuntamente, não só na formulação de objetivos, mas também nas estruturação da própria organização."

Assim, qualquer mudança organizacional deverá estar sujeita a uma estratégia ou plano de operações em todas as fases, desde sua elaboração até sua implantação e análise de resultados. Estratégia que deve ser a mais ampla possível, abrangendo o que fazer e como fazer.

Kleber Nascimento
("Reflexões sobre Estratégia de Reforma Administrativa", in Beatriz Warlich, op. cit., p. 88 e seguintes) apresenta um amplo modelo, com os seguintes elementos:

componente valorativo ou ideológico, que condiciona os demais, como premissas, crenças, atitudes e valores que fundamentam a filosofia dos agentes da mudança (por exemplo, reforma de orientação processualística x modernização de orientação teleológica, etc.);

componente substantivo, que define a amplitude ou abrangência (global x seletiva), a perspectiva temporal (imediatista x gradualista), a orientação diagnóstica (cognotivista, como falta de dados, limitação de competência técnica, inadequação da legislação, etc. x valorativista, como falta e interesse, falta iniciativa, resistência à mudança, etc.);

componente operativo ou comportamental – formas de ação dos agentes da mudança, como foco de ação (elementos formais como organograma x informais, como treinamento), processos de influência (impositivo, autoritário x motivador, internalizador) e dinâmica do poder (insulativa x cooptativa).

O advogado brasileiro se vê, a cada dia, mais pressionado por forças endógenas rumo à inovação, num ambiente altamente competitivo, e por forças exógenas, rumo à modernização de seu trabalho.

Muito ajudará nesse caminho, esperamos, a internalização dos conceitos expostos acima, em especial os pontos básicos a seguir resumidos.

Para o sucesso da organização advocatícia, deve ser reconhecida a presença das características do formalismo, superposição e heterogeneidade, na sociedade prismática brasileira, compelida historicamente a atingir o estágio de desenvolvimento de sociedades mais evoluídas.

Antes de se preocupar com a racionalidade administrativa do escritório, pensamos deva o advogado adequar as condições de seu empreendimento à satisfação das demandas ambientais, elaborando melhor seu produto final (racionalidade dos "outputs").

É importante o trato conjunto dos propósitos sociais e da racionalidade interna da organização.

Qualquer mudança da advocacia, seja modernização, seja inovação, há que se sujeitar a uma prévia estratégia de ação, com valoração adequada dos aspectos teleológicos, dentro de abrangência global, com perspectiva temporal gradualista, orientação diagnóstica dosada entre os extremos cognotivista e valorativista, e prévio treinamento dos agentes da mudança, garantindo-se o correto processo de influência.  Isto sem perder de vista as situações relativas à dinâmica do poder e aproveitando oportunidades ambientais de cooptação.

Se, de um lado, este trabalho pode fornecer alguns subsídios à melhoria dos meios e racionalidade interna (eficiência) da empresa advocatícia, de outro lado, esperamos que os propósitos sociais da profissão adquiram, aqui, relevo especial.

A advocacia, como poucas profissões, deve destacar ao extremo a área-chave de resultados sociais (responsabilidade social), já que, como serviço público auxiliar da justiça, está vinculada a este objetivo social da maior importância: a própria justiça, cuja conceituação, em abstrato, é de suma dificuldade.



"Justiça é idéia-valor; justiça é sentimento; justiça é retribuição. Como idéia-valor, a justiça exprime um precipitado da experiência histórica, que nossa capacidade conceitual projeta no espaço social da gente humana. De fato. Se não vivêssemos em sociedade, não haveria idéia de justiça. Ela é produto da convivência social que o pensamento elaborou. ... Justiça como sentimento é a virtude, a qualidade do homem justo. Ela se realiza em sua conduta, em suas ações. ... Como retribuição, justitia est constans et perpetua voluntas suum cuique tribuendi" (
HERMES LIMA, Introdução à Ciência do Direito, Livraria Freitas Bastos, 18ª. ed., p. 164/165).

"Mas prossigamos na análise do sentimento de justiça. Já dissemos que para ele (L. Duguit) esse sentimento corresponde ao que Aristóteles e Santo Tomás descrevem como justiça cumulativa e justiça distributiva: o homem tem o sentimento de que na troca de valores e serviços se deve observar a maior igualdade – é a justiça cumulativa; além disso, ele tem a aspiração de que a cada indivíduo caiba a situação correspondente ao papel que representa e aos serviços que presta na vida do grupo – é a justiça distributiva. ... Não podendo o indivíduo ter tudo para si, a afirmação in natura da personalidade diante da coexistência se tornando inviável, através da experiência, acabou por se contentar com um mínimo compatível com ela o qual se exprime no sentido de igual participação, no ideal do suum cuique tribuere ... O sentimento da participação proporcional, que se exprime no ideal de justiça distributiva, constituiu uma possibilidade a maior para a personalidade, na sua tendência afirmadora egoística. ... Não é sem razão que o ideal socialista, desconfiado da técnica da justiça distributiva, tende a substituí-la pela participação segundo as necessidades e não segundo as possibilidades de cada qual; que o cristianismo procurou substituí-lo pelo amor ao próximo e fortalecer o sentimento de igual participação, da justiça cumulativa, com a fraternidade em Cristo, da caridade, é que a construção democrática da cidadania não se satisfez apenas com o princípio da igualdade, mas também adicionou o de fraternidade, para fortalecê-la melhor. No fundo, o sentimento de justiça é, como bem viu Duguit, um sentimento egoístico, de interesses conciliados, permanecendo nele, entretanto, o resíduo afirmador em perpétua tendência de ruptura e afirmação, que encontra nas organizações estáveis normais, jurídicas, de interesses conciliados, do Estado de Direito, o respiradouro derivativo da justiça distributiva, como processo de realização relativa, sem distúrbio essencial, da tendência afirmadora"
(CARLOS CAMPOS, Sociologia e Filosofia do Direito, Ed. Cardal Ltda., 1961, p. 43/46),.

Santo Agostinho, na CIVITAS  DEI, citado por Hans Kelsen
(Teoria Pura do Direito, 4a. ed., Coimbra, 1976, p. 80/81),   salienta que o Direito não pode existir onde não exista a verdadeira Justiça. O que acontece de conformidade com o Direito, acontece de fato justamente; o que é feito de uma maneira injusta, não pode acontecer segundo o Direito.

Kelsen (op. cit., pág. 83/84) critica essa posição:

"Se a Justiça é tomada como o critério da ordem normativa a designar como Direito, então as ordens coercitivas capitalistas do mundo ocidental não são de forma alguma Direito do ponto de vista do ideal comunista do Direito, e a ordem coercitiva comunista da União Soviética não é também de forma alguma Direito do ponto de vista do ideal de Justiça capitalista. Um conceito de Direito que conduz a uma tal conseqüência não pode ser aceito por uma ciência jurídica positiva. Uma ordem jurídica pode ser julgada como injusta do ponto de vista de uma determinada norma de Justiça. O fato, porém, de o conteúdo de uma ordem coercitiva eficaz poder ser julgado como injusto, não constitui de qualquer forma um fundamento para não considerar como válida essa ordem coercitiva".

Pois bem, justiça ou direito, Direito e Justiça são os valores básicos delimitadores da missão do advogado. Nestes limites esbarrarão sempre os objetivos do profissional – e estes sempre hão de se curvar àqueles, pena de derrocada completa, a longo ou a curto prazo, de qualquer empreendimento encetado.

Por exemplo, a quantidade de clientes ou de causas de um escritório será antes um indicador de resultados sociais – número de pessoas que estão ou serão atendidas (justiça distributiva – suum cuique tribuere), do que um indicador de resultados financeiros ou de posição no mercado.

O microcomputador, por seu lado, será um instrumento, nada mais do que isso, para conceder mais tempo ao advogado, tempo para se dedicar à nobre função; para viabilizar melhor qualidade no atendimento daqueles que demandam justiça; para auxiliar a obtenção de custos mais baixos em cada causa, com conseqüente cobrança de honorários mais justos – inclusive repassar os custos de causas daqueles carentes de recursos para aqueles com maiores recursos.

Instrumento, nada mais do que isso, para fornecer melhores controles e conseqüente maior celeridade no andamento dos feitos – justiça mais rápida.

Instrumento, nada mais do que isso, para acessar mais rápida e racionalmente as informações jurídicas necessárias à defesa do direito de cada qual (suum cuique tribuere).

Instrumento, nada mais do que isso, colocado a serviço do Direito e da Justiça.

 
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